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segunda-feira, 25 de junho de 2012

Matrix filosófica



  Em que medida pode-se encontrar o discurso filosófico no roteiro do filme Matrix de 1999 dirigido pelos irmãos Wachowski?

  A começar pela etimologia dos nomes dos personagens e do próprio título do filme encontramos referências à mitologia grega e a origem grega das palavras. Prelúdio para alcançar o pensamento socrático. Morpheus é o deus grego dos sonhos e Neo vem de novo, renovado. Matrix tem origem no latim e no filme em que intitula carrega em si os significados que, em resumo, apontam para representação primordial de onde tudo tem origem. Também é destacada a figura do “oráculo” tal como na Grécia antiga, ou seja, a resposta de uma divindade a quem a consulta.

  Um dos fundadores da filosofia, Sócrates foi explicitamente citado a partir de seus ensinamentos e Neo, comparado a ele por seu inconformismo. Ambos buscaram o oráculo para sanar dúvidas interiores e a partir da reflexão dessas respostas tomaram seus lugares de destaque. Neo na ficção e Sócrates no mundo real. (Se é que, depois desse estudo, é possível determinar com veemência o que é ficção e o que é realidade.)

  Sócrates reconhece que é necessário buscar por conhecimento com seu método de desconstrução de saberes estabelecidos para a construção de novos conceitos nem sempre definitivos. E com esse processo vai desvendando o olhar do mundo com novos valores e verdades. Para Neo a inquietude do saber surge em suas incursões ao mundo cibernético e como Sócrates é levado a desnudar suas verdades estabelecidas. Nesse caso, quem o instiga é Morfeu em alusão ao deus do sonho que voa pela noite adormecendo os humanos ao tocar-lhes com uma papoula vermelha. O Morfeu do filme oferece a Neo a verdade ou o “sono”, desconhecimento eterno, ao escolher a pílula vermelha em detrimento da azul, Neo opta por ver a verdade. Daí por diante, reconhece que sua missão é libertar da Matrix quantos humanos forem possível, isto é, trazer as eles a luz da realidade, assim como, fazia Sócrates aos atenienses.

  Portanto, além do paralelo existente entre o protagonista e o filósofo é possível concluir que o percurso de ambos está alegoricamente retratado em “O mito da caverna”, passagem contada por Sócrates a Platão, seu discípulo, quem registrou por escrito*. A caverna nada mais é que a Matrix ou o nosso mundo. Os programas que eram carregados na Matrix prendiam os humanos a ela, igualmente, as correntes aos prisioneiros. E as sombras projetadas no interior da caverna é o quê na Matrix era tudo capaz de ser visto. O prisioneiro que se liberta e vai ao encontro da luz é Neo que ao vislumbrar a verdade se incumbe da missão de libertar as mentes humanas da ilusão que é a Matrix.

*Sócrates criou o “Mito da Caverna” e contou-o a Platão e seus irmãos Glauco e Adimanto. Platão, então, registrou esse diálogo no livro VII de A República.
Por Bruna Freesz.

terça-feira, 19 de junho de 2012

A essência do jornalismo literário


  Jornalismo literário é um gênero jornalístico, que rompe os limites das matérias tradicionais. Os frutos desse  tipo de jornalismo surgem de uma pauta distante da mesmice, uma apuração profunda, detalhada e ampla. O ponto de partida é a realidade, por isso o jornalista precisa tomar cuidado para não fantasiar demais.

  O texto do jornalismo literário instiga, seduz o leitor e o surpreende no final sem escapar da sua característica principal: passar a informação real. O livro “O segredo de Joe Gould”, de Joseph Mitchel, é um exemplo dessas  ações. Além dele é possível destacar outras grandes obras do gênero, como, “A Sangue Frio”, de Truman Capote.
   Para escrever obras tão grandiosas esses  autores se envolveram com as fontes e ganharam  confiança para obter informações precisas. É um trabalho árduo, pois além de seduzir a fonte é preciso ter paciência e tempo. As informações relatadas não aparecem de um dia para o outro. Elas surgem aos poucos de acordo com o crescimento da intimidade entre a fonte e o jornalista.

  Seguir esse  ramo na carreira profissional é bastante interessante, no entanto, penso: É possível fazer isso numa era em que a velocidade dita as regras? Em que muitas entrevistas são feitas por e-mail e telefone distanciando o jornalista da fonte? O jornalista pode ter a liberdade de relatar os fatos envolvendo o leitor, fazendo-o  adentrar a história e ter um olhar diferenciado que talvez não surgisse numa matéria de uma lauda.

   Obras desse  gênero foram adaptadas para o cinema, como é o caso de “A Sangue Frio”.

  Por Priscila Pacheco 



Galeria de fotos
Truman Capote
Joe Gould


Joseph Mitchell






quinta-feira, 14 de junho de 2012

Chocolate – um olhar semiótico


O filme Chocolate de 2000, dirigido por Lasse Hallström, apresenta histórias que causam discussões relacionadas ao preconceito, ao papel da mulher e à influência da religião e do poder na sociedade, na cidade fictícia de Lansquenet-sous-Tannes. Entretanto, Chocolate também nos possibilita análises semióticas em cada cena. 
A resenha a seguir concorda com estudos semióticos de Charles Sanders Peirce, um dos fundadores da moderna semiótica geral, segundo Winfried Nöth, em o Panorama da Semiótica. Consideramos 3 níveis semióticos, o qualitativo-icônico, o singular-indicativo e o convencional-simbólico presentes na película.
No 1º nível, analisamos os aspectos qualitativos da cena, ou seja, aqueles responsáveis pela primeira impressão provocada no receptor, tais como cores, formas e textura das imagens. No 2º, a mensagem é vista como algo existente em espaço e tempo determinados, sendo analisada em seu contexto e finalidade, assim, há uma busca em se perceber possíveis indícios em tudo o que está sendo transmitido. O 3º examina o poder representativo do filme, levando em conta os significados e valores que possua. Aqui, portanto, faz-se a interpretação da mensagem como um todo.

     Ícone
De acordo com os estudos Peirce é possível dizer que os objetos religiosos mostrados na igreja, a fotografia da esposa sobre a mesa do escritório e a estátua do pai do Conde Paul de Reynaud, os retratos que Luc Clairmont, filho de Caroline, desenha e a ânfora que Vianne Rocher guarda as cinzas da mãe são alguns dos exemplos de ícones. Entretanto, o maior ícone do filme fica por conta do chocolate, apresentado em vários momentos, de formas variadas, ora na panela com consistência cremosa, ora em barras, ora esculpido para a vitrine da chocolataria.

     Índice
Destacamos alguns índices observados nas cenas: A chegada de Vianne Rocher e sua filha Annouk, ao vilarejo, vestidas com capuz vermelho é indício de que trazem “doces”, em referência direta ao conto dos irmãos Grimm, Chapeuzinho Vermelho. O grito desesperador de Vianne no deck do rio ao ver o barco incendiado indica que a protagonista imaginou que a filha estivesse morta, já que todos haviam adormecido nos barcos. Os sermões proferidos pelo padre, cujo texto e suas revisões são do Conde Reynaud, representam um discurso autoritário e controlador, entretanto, justificado pelo caráter sagrado. Por fim, a presença de estrangeiros no vilarejo ressalta a ideia de que algo na comunidade será alterado, inicialmente com a chegada de Vianne e cenas depois a sensação de instabilidade é detonada com a presença do músico e andarilho Roux.


Símbolo
Segundo Peirce o “símbolo é um signo que se refere ao objeto que denota, em virtude, de uma lei, normalmente uma associação de ideias gerais”. Assim, o chocolate da loja de Vianne é a libertação, o estímulo para mudança de atitudes. O exemplo está na transformação que o chocolate causou na vida da personagem Josephine, ao perceber que seria capaz de sobreviver longe da dominação do marido. A religiosidade radical imposta pelo Conde Reynaud é a prisão, a alienadora de mentes. Isso transparece na imposição do luto da personagem Madame Audel. Seu marido havia falecido na Primeira Guerra Mundial e, no entanto, décadas depois, ainda lhe era exigido o luto. As cinzas que Vianne guardava de sua mãe representam o apego ao passado, e o ato de jogá-las ao vento é mais um símbolo de libertação, assim como, quando o Conde invade a loja e devora os chocolates após tentar destruí-los, se rendendo aos desejos, a ponto de adormecer, em clara entrega física e mental.

Aproveitando o clima ouça a música "Chocolate", de Marisa Monte.

Bibliografia
NÖTH, Winfried. Panorama da Semiótica: de Platão a Peirce. 2ª edição. São Paulo: Editora Annablume, 1995.
Bruna Freesz e Priscila Pacheco